sábado, 14 de outubro de 2023

FRATERNOS

 

ElsonMAraújo

Terra, fogo, água e o ar são os elementos da Natureza. Todos eles importantes para a composição da vida na Terra. Mas, um é mais do que todos porque verdadeiramente conecta os seres vivos do Planeta Terra: O elemento ar. Já tinha pensado nisso?

Queiramos ou não nós, negros brancos, amarelos, índios, estamos todos irmanados pelo ar que respiramos. Não é preciso nem buscar alguma prova disso.  É só imaginar a superfície terrestre privada por alguns minutos desse elemento vital, o oxigênio. O espírito que em nós tem abrigo seria expulso sem demora é só sobraria a carcaça que desapareceria consumida pelo elemento terra.  “Do pó viemos ao pó voltaremos”

Assim, como não pode existir o fogo e água sem a sagrada partícula do oxigênio, a vida também não. A gente pode até aguentar alguns dias sem água, sem comida; mas sem respirar, essa possibilidade é igual a zero.

O oxigênio que cobre os continentes é o mesmo. O que muda, é a forma como ele é tratado.  Em algumas cidades do mundo a poluição do ar é uma realidade presente e letal; são milhões de partículas poluentes lançadas ao vento,  e  que já afeta a saúde igualmente  de milhões de pessoas e tudo isso provocado pela ação do próprio homem.

Dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) apontam que 80% das cidades possuem um nível de poluição do ar acima do que é saudável para o ser humano. China, Índia, Irã e Arábia Saudita, já abrigam as cidades com o ar mais poluído do mundo. O ar não tem fronteira e quem não polui também acaba afetado. Triste, uma coisa dessa.

Como é difícil compreender essa situação:  se o ar (oxigênio) é o elemento vital para a vida na Terra por que dele os homens não cuidam?   O mundo, que já sofre pela escassez de água, não demorará muito estará chorando pela escassez generalizada de ar puro para respirar com o real risco da auto extinção

Os poetas, romancistas, ensaistas, compositores, enfim, quem gosta de escrever e pensar o mundo, costumo dizer, têm um quê de profeta. Em pare o mundo que eu quero descer, composta na década de 1970, o cantor e compositor  Silvio Brito,   como já prevendo essa grande tragédia ambiental  escreve,  e canta: 

 


“Pare o mundo

Que eu quero descer

Que eu não aguento mais

Escovar os dentes

Com a boca cheia de fumaça...”

 

Num outro trecho o autor se aprofunda:

 

“E pensar que a poluição

Contaminou até as lágrimas

E eu não consigo mais chorar

E ainda por cima...

Tem que pagar pra nascer

Tem que pagar pra viver

Tem que pagar pra morrer...

Tá tudo errado

Tá tudo errado

Desorientado segue o mundo

Enquanto eu vou

Ficando aqui parado”

É ou não é,  o retrato do mundo em que hoje vivemos?

O que não pode são os homens de bem e de boa vontade ficarem sentados naquela condição cantada por outro profeta musical brasileiro, o mestre Raul,  num trecho da sua Ouro de tolo:  Eu é que não me sento no trono de um apartamento Com a boca escancarada, cheia de dentes esperando a morte chegar. ..

 


sábado, 7 de outubro de 2023

A LATA DE FRITO



ElsonMAraujo

 

As memórias, prefiro as boas, tornam imortais nossos entes queridos.  Quando menos a gente espera, um cheiro, uma música, uma paisagem, uma viagem, uma música; pronto, lá vêm o retumbar das memórias, uma atrás da outra, a nos transportar ao doce jardim das lembranças. Lá, livremente, voltamos a reviver as vidas encarnadas, principalmente na infância e na adolescência. Feliz de quem consegue ancorar boas memórias. É que elas, às vezes, costumam funcionar como um bálsamo para nossas dores.

Carrego boas memórias dos meus pais, que há muito partiram para o Oriente Eterno. Uma ausência presente, como diria minha dileta confreira, da Academia Imperatrizense de Letras Liratelma Alves. Dia desses, ela falava sobre as ausências presentes, e as presenças ausentes. Achei aquilo fantástico, já que se aplica direitinho na minha relação com meus pais, ausências sempre presentes.

Há pelo menos duas semanas que sou visitado pelas memórias da minha adorável mãe, principalmente as vividas na infância. Éramos, unha e carne.   Não fui um menino fácil, mas ela nunca deixou de me proteger. Por diversas vezes, quando era ora de dormir, antes de adormecer, a escutava rezando bem baixinho pedindo a Deus que protegesse sempre a mim, e a meus irmãos.  Gostava demais daquilo, e dormia. Dormia feito um anjo.

Ontem, às 13h55, ainda sem saber com o que ocupar este espaço, preocupado porque falhei na semana passada e não querida falhar novamente, minha mãe veio ao meu socorro. Pegou nas minhas mãos e me transportou aos meus sete anos de idade. É, não consigo lembrar de coisas havidas há 20 minutos, mas consigo lembrar bem,  de muitos fatos da infância. E assim, aconteceu.

Morávamos numa pequena cidade. Não havia água encanada, e só os mais abastados tinham poço no quintal, o que não era nosso caso.  Para beber e lavar louça, era até fácil. A água vinha do poço da casa vizinha. Agora, para lavar roupa, a coisa complicava. Exigia uma certa logística, que começava um dia antes, quando minha mãe juntava a roupa suja da semana.  Não havia sabão em pó, nem desses bonitinhos que a gente compra na quitanda. O sabão, quase sempre era de fato de porco e potassa.

Cuidadosamente minha mãe ia separando a roupa suja para formar uma imensa trouxa. Feito isso, vinha a parte da qual mais gostava: o frito de galinha caipira, temperada com alho, sal, pimenta do reino, e o cheiro verde (cebolinha, coentro) tirado de um canteiro, no fundo do quintal.  Nunca faltou uma penosa no quintal lá de casa.  Depois de pronta, a iguaria era misturada numa farinha (puba) e posta numa lata, e tampada. Só seria aberta, ao meio dia, do dia seguinte, no intervalo da lavagem de roupa. Dormia, pensando no frito.

Não me pergunte como minha adorável mãe conseguia andar, cerca de um quilômetro, com uma trouxa de roupa na cabeça, sem nenhuma ameaça de queda, levar debaixo do braço uma lata de frito, ficar de olho no peralta do Elson Araújo que lhe acompanhava nessa aventura, e ainda ficar atenta na vereda que conduziria até a beira do brejo, numa propriedade rural que o dono abria para as donas de casa lavar roupa.  Fazia tudo isso e ainda cantava. Confesso, que naquela idade, só pensava mesmo era no frito da hora do almoço.

Enquanto minha mãe “batia a roupa”, eu passava o tempo mordendo manga, e chupando caju. Era tanta fartura que deixava tudo pela metade. Os dentes, ainda de leite, ficavam dormentes, mas eu nem ligava. Entre uma mordida e outra, o pensamento voava até a lata de frito.

No pingo do meio dia, começava a ouvir de longe minha mãe me chamar.  Ela já havia terminado a lavagem e punha a roupa espalhada pelas ramagens para quarar (procedimento que consiste em deixar as peças ensaboadas expostas ao sol por um longo período).

 A palavra mágica era “ Elsonnnn, vem almoçarrrr”. Largava tudo e lá ia eu correndo, descalço, sem medo de ferir os pés ou levar uma queda. Chegava o momento da abertura da lata de frito.


Minha mãe, parecia que sabia do prazer que tinha de vê-la abrir a lata de frito e subir aquele cheiro, curtido de um dia para o outro, que só os iniciados são capazes de compreender. E era assim, ela só abria a lata quando eu chegava.

Com o vestido de chita molhado, colado ao corpo, minha mãe sentada na tábua de lavar roupa, me chamava para perto dela, e ali, só eu e ela, debaixo do sol quente, sob o testemunho do canto do bem-te-vi, das pipiras, do anum, e do barulho da água batendo nas pedras, ela, ritualisticamente, abria a lata de frito.

Para se juntar àquele saboroso banquete, um punhado de peixinhos cercava a tábua de lavar roupas para também se deliciar com punhados de farofa que caiam no brejo a cada mordida nos pedaços do frito da caipira. E eu, ali, hipnotizado, já pensando na próxima lavagem de roupa.

Gratidão, querida mãe.

 

 

 

QUANDO DEIXEI DE ACREDITAR EM PAPAI NOEL

    ElsonMAraújo Neste dezembro de 2023, mais precisamente no próximo dia 25, completarão-se 49 anos desde que deixei de acreditar em Papa...