sábado, 16 de dezembro de 2023

QUANDO DEIXEI DE ACREDITAR EM PAPAI NOEL

 

 ElsonMAraújo

Neste dezembro de 2023, mais precisamente no próximo dia 25, completarão-se 49 anos desde que deixei de acreditar em Papai Noel. A ruptura com essa lúdica crença num personagem lendário da cultura cristã ocidental foi traumática. Numa só noite/madrugada fui acometido de sentimentos incompreensíveis para um menino, ainda na primeira infância. Devo ter chorado por pelo menos um dia. Tinha seis anos de idade, vivi um verdadeiro luto.

Hoje identifico que até a ficha cair e descobrir que Papai Noel era uma ficção, sofri com o sentimento de culpa. Afinal, o que teria eu feito de ruim para que naquele Natal, o “bom velhinho” não deixasse meu presente no “pé da minha rede”?

Justo naquela noite tinha armado um plano para flagrar a chegada do Papai Noel. No ano anterior, me esforcei, mas não o vi chegando com um carrinho de plástico vermelho, que durou até o meio do ano. Gostava de carrinhos e naquele Natal, de 49 anos atrás, torcia para ganhar uma C 10. Uma C 10 verde, igual à que um primo tinha sido contemplado, dois anos antes.

O plano para flagrar o Papai Noel era fingir que estava dormindo. Uma luta inglória, pois o sono era grande demais. Mesmo assim, com aquele plano na cabeça, no menor dos barulhos eu acordava e dizia para mim mesmo: “É ele!” O barulho sumia. Olhava para debaixo da rede, não via o carrinho que pedi e voltava a dormir. E assim, foi até amanhecer o dia. Não teve presente nenhum.

Para garantir o presente do Papai Noel, a orientação dos irmãos mais velhos, pais e professores, era pra gente ser sempre obediente, estudioso, respeitar os mais velhos, e ir à missa das crianças todos os domingos. Havia feito tudo isso, o ano inteiro, mas, mesmo assim, não ganhei meu carrinho.

Por mais que vasculhasse a memória não encontrava nenhum delito que motivasse aquele castigo. Teria sido porque tentei vê-lo? Nada justificava. Tinha certeza que tinha sido um bom garoto.

Do sentimento de culpa nasceram a frustração e o ódio. Nunca perdoaria o Papai Noel por aquela covardia. Prometi que iria odiá-lo para sempre.

Como não parava de chorar, minha família preocupada, designou minha irmã normalista Margarete  para a missão de me explicar o que ocorrera de verdade. Já era grandinho e estava na hora de saber que Papai Noel não existe.

Sempre muito habilidosa, minha irmã foi por longe. Me pôs nas pernas, enxugou minhas lágrimas, disse que eu era bom menino e que Papai Noel não viera naquela Natal não por alguma peraltice que eu tivesse feito, e sim porque, simplesmente, não existia.

-Mas ano passado ele veio, deixou até meu carrinho vermelho. É mentira, ele existe sim.

-Não, meu querido irmão. Não existe! Quem sempre deixou o presente de Natal debaixo da tua rede foi o papai. Este ano ele não teve dinheiro para comprar presente para todo mundo e para beneficiar um e outro não, preferiu não presentear nenhum dos filhos.

A notícia foi devastadora. Eu não conseguia acreditar que aquele mundo mágico que eu havia construído na minha cabeça não passava de uma fantasia. O Papai Noel não existia? Como isso era possível?

Senti-me traído, enganado.

O choro foi embora, mas durante dias, fiquei pensativo, tentando entender aquela nova verdade. Não queria conversa com mais ninguém. Aos poucos, fui me acostumando com a ideia de que o Papai Noel não existia

O lado positivo da experiência do Natal dos meus seis anos de idade, foi um importante passo no meu processo de amadurecimento. Foi a primeira vez que fui confrontado com a realidade, com o mundo como ele realmente é. Para completar, naquele ano me deparei com a primeira noticia do assassinato de uma pessoa, o prefeito da cidade, Joaquim Baltazar tinha sido morto por pistoleiros. A cidade era Axixá (GO) , hoje pertencente ao Estado do Tocantins.

Aprendi que nem tudo é o que parece, que existem mentiras e decepções. Mas também aprendi que é importante manter a fé, mesmo quando tudo parece perdido. Afinal, mesmo que o Papai Noel não exista, ainda existia pessoas boas no mundo, como meu saudoso pai, dispostas a fazer o bem.

 

domingo, 3 de dezembro de 2023

Saudade, alimento da alma



ElsonMAraujo

Em memória da professora Maria Luíza Brandão

 Para quem gosta de escrever, e escreve com regularidade, alguns temas são recorrentes. Às vezes, por achar repetitivo, você até tenta empurrá-los mais para frente, mas, quando o escriba se rebela, vem a vingança, não me pergunte da parte de quem, e a escassez de inspiração aparece, dando origem a uma briga silenciosa.  É que, enquanto o tal {texto} que insiste em nascer não é liberado, a fila não anda e a inspiração para outro assunto, não flui. Não duvide!  Sou testemunha disso.  Acontece comigo sempre. Hoje, a insistência é da tal da saudade. 

Não sei se é por conta da maturidade, mas saudade tem sido um desses temas que chegam a mim com frequência. Acredito que não se trata de uma exclusividade, minha.  Aos sábados, quando o Jornal O Progresso, da cidade de Imperatriz, sudoeste do Maranhão, abre as cortinas do seu caderno de literatura, é comum encontrar um ou mais textos versando sobre saudade. O campeão, disparado, é o mestre das crônicas Clemente Viegas, talvez eu fique em terceiro, ou quem sabe, quarto lugar.

A professora Maria Luiza Brandão, de saudosa memória, a mãe do Carlos, também in memoriam, e do Francisco Brandão, e avó do jornalista Carlos Henrique, do Márcio e da Marcella, gostava de conversar comigo, muita antes de eu me aventurar nessa seara da literatura, sobre as crônicas que todos os sábados ou aos domingos ela lia em O Progresso, e no caderno de cultura do Jornal O Estado do Maranhão. Quando não destacava Sálvio Dino, que era cronista semanal de O Estado, comentava Viegas, há anos questionando o social nas páginas de O Progresso e nas ondas da Radio Mirante AM, de São Luís. E não tinha jeito, o que mais lhe chamava atenção era quando os dois cronistas destacavam o elemento saudade.

“A gente viaja nas histórias do Viegas. Ele nos conduz para dentro do que conta, fazendo a gente sentir saudade, sem saber nem do que.  O Doutor Sálvio, é outro. Gosto demais do que eles escrevem”, dizia a inteligente e antenada professora despertando ali, naquele instante, uma vontade danada de também começar a escrever crônicas.

Tenho saudade das conversas havidas com a professora, que era uma grande contadora de histórias.  Pelo menos uma vez por semana, ali na esquina da Simplicio com a Rua São Domingos, lá estava eu, a provocá-la sobre qualquer assunto. De política a literatura, de tudo ela tinha uma observação.   Com o tempo, e o fortalecimento dos laços fraternais, com a permissão do Carlos e do Francisco, passei a chamá-la de “mãe Maria Luíza”, seguida da frase “a moça mais bonita do quarteirão”. Percebi que ela gostava daquele mimo.  E foi assim, até ela adoecer, fechar o comércio, e partir para o Oriente Eterno.

Foi numa das conversas com Mãe Maria Luíza Brandão, que descobri a história do Frei Alberto Beretta, o padre/médico de Grajaú, que na década 1960 ganhou fama de santo pelas curas inimagináveis, para a época, de alguns doentes que se avistavam com ele.  A história me rendeu uma bela reportagem sobre o padre, que no interior do Maranhão teria sido, embora não reconhecido, o precursor do uso de células tronco na cura de determinadas doenças. O texto foi publicado em O Progresso, e no Jornal o Estado do Maranhão, ganhou as redes sociais e repercute até hoje.

Embora, em regra, o elemento saudade nos leve às lágrimas, não deixa de ser um tema leve. Digo até que é um dos principais alimentos para sagrar a imortalidade daqueles ou daquelas que partiram para outros planos.

A saudade hoje, é dela. Da professora Maria Luiza Brandão, a paraibana, da cidade de Esperança, que por anos exerceu o magistério em Imperatriz, e ajudou a formar centenas de bons cidadãos.

 

 

QUANDO DEIXEI DE ACREDITAR EM PAPAI NOEL

    ElsonMAraújo Neste dezembro de 2023, mais precisamente no próximo dia 25, completarão-se 49 anos desde que deixei de acreditar em Papa...