sábado, 25 de fevereiro de 2023

A Guerra do Leda: Da fuga do Maranhão, ao linchamento em praça pública, em terras paraenses

 

                                       Cidade de Grajau (MA) epicentro da "Guerra do Leda"

       

ElsonMAraujo

 

Chegamos ao terceiro texto onde assentamos um fragmento da história do Maranhão ainda pouco conhecido: “A Guerra do Leda”, que segundo a historiadora Layla Adriana Teixeira Vieira, e ainda o patrono da Cadeira 02 da Academia Imperatrizense de Letras, João Parsondas de Carvalho, bem como o saudoso Salvio Dino, da Academia Maranhense de Letras/ Academia Imperatrizense, se propunha a conquistar a independência política do Sertão Maranhense.

Sobre a Guerra do Leda é admitido, pelos raros estudos encontrados,  e sobretudo pelo relatos testemunhais de Parsondas  revisitados por Sálvio Dino, que  ela teve como um dos  epicentros a cidade de Grajaú, cognominada também naquele tempo de Vila da Chapada,  terra natal de um dos líderes da rebelião, o rico proprietário rural e político  Leão Rodrigues de Miranda Leda 


Leda era ferrenho adversário do então todo poderoso Benedito Leite, o senador da República que mandava mais do que o governador.


Os revoltosos aspiravam, nas palavras da historiadora Layla Adriana Teixeira, uma presença maior do Estado, e que o mesmo promovesse seu desenvolvimento por meio da aplicação de verbas que se destinassem à construção de estradas, escolas e postos de saúde.  Mas o movimento ganhou outros contornos depois do assassinato, em Grajaú, do promotor público Estolano Eustáquio Polary, no dia 16 de agosto de 1898.  É que o senador Benedito Leite aproveitou para atribuir o mando do crime a Leão Leda e seu grupo político.


Leda, conforme já contei, tentou se defender legalmente, mas quando percebeu que na verdade havia era uma sentença de morte e não uma  ordem de prisão, fugiu com mais de 20 homens armados. Iniciava ali, a maior caçada humana já registrada no alto sertão maranhense, com grande derramamento de sangue inocente.

Para capturar Leda e seus homens, Benedito Leite enviou várias guarnições para a região. Com o grupo fortemente armado, Leda conseguia sempre escapar do cerco policial. Os registros de Parsondas, revisitados por Sálvio Dino no livro Parsondas de Carvalho, um novo olhar sobre o sertão, narram a ocorrência de vários conflitos entre  a Polícia  e os  fugitivos, com mortes de ambos os lados.

 Com o agravamento da situação diante da resistência de Leda, é que surgiu a ordem para “castigar” quem desse abrigo para o fugitivo. Bastava uma suspeita para a liberação da licença para matar, estuprar, torturar e tomar a terra, na sua maioria, de pequenos proprietários rurais. Muitas das vítimas chegaram a ser degoladas e castradas.

 Na obra Guerra do Leda, um relato contemporâneo de Parsondas de Carvalho sobre a rebelião que deu nome ao livro, com riqueza de detalhes ele conta um desses episódios, ocorrido num povoado próximo a Carolina. Ali, um idoso, sob a suspeita de ter abrigado Leda e seus homens, depois de ser torturado, foi estripado por um soldado e depois atado a uma estaca para ser comido, segundo eles, pelos urubus, com a recomendação que, quem o tirasse dali para ser sepultado, passaria pelo mesmo suplicio.

 Na cidade Carolina, um padre que a Polícia suspeitou de ter dado abrigo ao grupo do Leda, para não morrer na hora, com a Igreja cercada, fugiu só de batina.

 A Guerra do Leda poderia ter sido totalmente varrida da história do Maranhão se não fosse o espirito inquieto do patrono da cadeira 02 da Academia Imperatrizense de Letras, Parsondas de Carvalho. Antes de escrever Guerra do Leda, para denunciar os crimes do Estado Maranhense contra a população pobre do alto sertão, ele escreveu e publicou vários artigos, principalmente em A Pacotilha, jornal que fazia oposição ao senador Benedito Leite. Mais do que isso, a cavalo,  Parsondas, um misto de jornalista, historiador, geógrafo e rábula (advogado) foi ao Rio de Janeiro e conseguiu também publicar seus artigos no influente Jornal do Brasil.

 Os textos de Parsonda, depois juntados em a Guerra do Leda, e posteriormente resgatados pelo advogado, político e historiador Sálvio Dino, em 2007, são considerados importantes pelos historiadores por abrigarem  as poucas referências sobre esse período sangrento da história do Maranhão , ocorrido entre o final do século XIX e início do século XX, aqui neste lado Maranhão. 

Guerra do Leda ainda é um campo amplo e aberto para os pesquisadores e historiadores maranhenses. 

 Bem, e o que aconteceu com Leão Leda?  Os homens de Benedito Leite depois de dezenas de mortes, dos dois lados da refrega e ainda do assassinato de dezenas de inocentes sem nenhum envolvimento na história, não conseguiram capturá-lo. Consta que entre 1898 e 1889 ele vagou pelo sul do Maranhão e norte do Goiás, fugindo da polícia maranhense, até que em 1900 fixa-se em Boa Vista do Tocantins, hoje Tocantinópolis (TO) onde refez sua vida e até tornou-se prefeito do lugar.

 Depois, essa informação encontrei na enciclopédia eletrônica Wikepedia, já no final de 1908, Leão Leda foi morar em Conceição do Araguaia, terra paraense que por algum tempo chegou a pertencer ao Estado de Goiás.  Seu forte ativismo nunca o afastou dos levantes políticos. Alí, se envolveu numa outra luta emancipacionista para criar um novo estado, que englobaria o sudeste do Pará e o norte do Goiás.  Comprou briga com o prelado Domingos Carrerot  que o  “acusou de ser maçom e judeu”, briga que não teve um final feliz.

 Consta que no dia oito de Março de 1909, por volta das 11 horas da manhã, incentivados por Dom Carrerot, um grupo de homens fortemente armado cercou a casa de Leda. Depois de 24 horas de conflito, todos que estavam na casa estavam mortos. 

Leda e o filho Mariano foram capturados e linchados em Praça Pública, dia nove de março de 1909. Terminava ali a vida do homem que quis emancipar o sertão maranhense  e depois,  territórios do Pará e do Goiás.

 

domingo, 19 de fevereiro de 2023

“A Guerra do Leda”: Assassinatos, estupros, castrações e esbulhos no alto sertão maranhense, no fim do século XIX

 

ElsonMAraujo

 

Superficialmente é estudado nas escolas que o alto sertão maranhense, região que compreende o sul do Estado, foi um dos últimos rincões do Estado a alcançar algum tipo de desenvolvimento.  “A costa sempre esteve de costas para este lado do Estado”. Isso incomodava muito, como até hoje incomoda, a gente da nossa região. Se na atualidade as ações do poder público ainda são escassas por aqui, imagine isso no final do século XIX e começo do século XX.  A sensação era de total abandono. O motivo da chamada “Guerra do Leda” foi esse sentimento, marcado por ferrenhas disputas políticas.

 Segundo a historiadora Layla Adriana Teixeira Vieira, num estudo acadêmico apresentado no simpósio nacional de história, em Natal (RN), em 2013, o movimento defendia, perceba a ousadia e o idealismo das lideranças da época, a independência política do sertão maranhense tendo como fundamento esse abandono regional e a carência de desenvolvimento.

Certamente essa movimentação não poderia passar ao largo dos olhos do governo maranhense, que tratou logo de sufocá-lo. Mas esse não é o alvo da coluna de hoje.  O destaque é para, diria, um fragmento, ainda pouco estudado, ou melhor um dos desdobramentos do levante pela emancipação do alto sertão maranhense que resultou num banho de sangue humano sob a “batuta” do então senador, naqueles idos um poderoso chefe político maranhense, Benedito Pereira Leite.

 Essa guerra, custou a vida de dezenas de inocentes. Foram inúmeros assassinatos, estupros, torturas. Além disso, muita gente teve as propriedades esbulhadas pelos soldados de Benedito Leite. Muitos dos que resistiam, eram castrados (capados) na frente de todo mundo.

 Esse pedaço da história do Maranhão foi registrado/denunciado pelo escritor, professor, jornalista, geógrafo e rábula (advogado) João Parsondas de Carvallho, no livro “A guerra do Leda”, e revisitado  em 2007 .pelo fundador da Cadeira 02 da Academia Imperatrizense de Letras , Sálvio Dino, que hoje ocupo e que tem como patrono Parsondas de Carvalho. O texto de hoje é desdobramento do anterior  , reveja (https://oprogressonet.com/noticia/28562/riqueza-literaria-do-maranhao). 

 

Pois, bem, como já fora dito, o saudoso Sálvio Dino, no livro livro Parsondas de Carvalho, um novo olhar sobre o sertão, revisita o livro A Guerra do Leda. A obra é um relato cruel desse esquecido fragmento da nossa história, ocorrido no final do século XIX, cuja motivação inicial era emancipar a região sul do Maranhão, mas que acabou em muito derramamento de sangue.

 O livro reportagem, Parsondas de Carvalho, um novo olhar sobre o sertão, de Sálvio Dino, pode ser considerado o principal documento produzido pelo fundador da Cadeira 02 da AIL, sobre seu patrono, testemunha dos acontecimentos daquele tempo em que o Maranhão era governado por João Gualberto Torreão da Costa, mas quem mandava era o poderoso chefe político e senador Benedito Pereira Leite.  Sigamos pelo túnel da história!

 

Na construção do livro reportagem, Salvio Dino, com o olhar do patrono, percorreu toda a região, visitou famílias, resgatou informações inéditas e até visitou o túmulo de Parsondas, que morreu em junho de 1916, na vizinha Montes Altos, onde está sepultado.

 

Toda a atrocidade ocorrida na “guerra do leda”, na apuração do acadêmico Sálvio Dino, foi denunciada por Parsondas de Carvalho nos jornais de São Luís, principalmente em A Pacotilha. Tamanha a vontade de tornar público e fazer barrar esses acontecimentos aqui na região, que ele, a cavalo, foi “bater no Rio Janeiro” para denunciar o episódio, no então Jornal do Brasil, um dos mais importantes jornais da sua época. Por essas terras, os relatos sobre a guerra do leda poderiam ter sido varridos para debaixo do tapete da história, se não fosse a coragem de Parsondas.

 O episódio é assim chamado “guerra do leda”  porque um dos protagonistas foi  o grajuense Leão Rodrigues de Miranda Leda , um rico político e  proprietário de terras desta região. De orientação liberal/republicana, Leda era ferrenho adversário de Benedito Leite e do governador da época. 

 Pode se dizer que o banho de sangue   e outras atrocidades   levadas a efeito sob o incentivo de Benedito Leite, e o patrocínio do Governo do Maranhão, teve início a partir do assassinato do promotor de Justiça, Estocolmo Eustáquio Polary, em 16 de agosto de 1898, em Grajau.  Na conjuntura da época, “prato perfeito” para o poderoso chefe político se livrar de um adversário, que há muito vinha lhe incomodando. A estratégia para isso, foi acusar Leda, o genro dele Tomaz Moreira , e todo seu grupo,  pela encomenda do crime.

 A morte de Polary acabou por justificar o envio pelo governo maranhense de um grande contingente da Polícia para a região.

 Já havia um conflito político por causa da luta pela emancipação da região, que tinha Leão Leda como um dos líderes, mas o caldo engrossou mesmo, foi depois do assassinato do promotor público. Naquele tempo, algumas dessas disputas eram resolvidas na base da bala.  Agora, imagine isso quando a peleja tinha numa ponta um prestigiado e influente chefe político, e na outra, um rico proprietário de terras, adversário ferrenho dos mandatários do Maranhão.

 Leão Leda não era bobo. Isso fica claro na obra de Salvio Dino/Parsondas. Ele Sabia da existência do devido processo legal e que não poderia ser acusado unilateralmente de um crime, que dizia não ter praticado, e não poder se defender. Fez uma visita ao magistrado do lugar, impetrou habeas corpus, enfim, tentou se defender legalmente, mas quando viu que o legal não resolveria, se apropriou de um método de defesa muito utilizado nos rincões do Brasil, naquele tempo. Ele contratou, pelo menos, duas dezenas de pistoleiros para fazer a sua segurança. Se tornou um fugitivo da Polícia.  Sabia que a ordem dos Leões, no caso de prisão, seria sua execução.   Havia ali uma implícita “sentença de morte” conta Leão Leda que não ficou na cidade para “pagar para ver” .

 Como o espaço da coluna acabou, não é possível contar o desfecho dessa história na edição de hoje. Na semana que vem, o final dessa história. 

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2023

Os 408 anos da guerra que expulsou os franceses da costa maranhense

                                    

                                Pintura de autoria de Armando Viana. A acervo do Museu de História do Rio de Janeiro


ElsonMAraujo

Novembro foi embora e pouco se lembrou do aniversário dos 408 anos da Batalha de Guaxenduba, evento bélico, que segundo a história, determinou a expulsão dos franceses da Costa Norte do Brasil, a partir da Ilha de São Luís, onde eles já estavam assentados desde setembro de 1612, sendo atribuída a eles, dessa forma, a fundação da nossa capital.

Os registros históricos apontam o 19 de novembro de 1614 como o dia D, da batalha. De um lado, os franceses, comandados por Daniel de La Touche, que contavam com o reforço dos índios Tupinambás, nativos da Ilha de Upaon-Açú, e do outro, os portugueses, sob o comando do capitão-mor Jerônimo de Albuquerque e do sargento-mor Diogo Campos Moreno, com o apoio dos povos Tabajaras e Tremembés. Daí, é possível imaginar o quanto foi sangrento esse importante evento da história do Brasil.

A Guerra de Guaxenduba ocorrida na costa maranhense frustrou o sonho da França Equinocial intentado pelos franceses, que já vinham de várias incursões para se apoderar de terras, até então sob o domínio Português/Espanhol. Dessa aventura, restou somente a Guiana, Departamento Ultramarino do Governo Francês, que faz fronteira com o município de Oiapoque, no Amapá.

Há uma unanimidade entre os Historiadores ao afirmarem que se não fora a expulsão dos franceses, a partir da Batalha de Guaxenduba, hoje grande parte do norte e do nordeste do Brasil teria o francês como língua oficial, já que eles ambicionavam, não só o domínio da “Grande Ilha”, mas de toda Costa Norte do Brasil, incluindo a região Amazônica.


Jerônimo de Albuquerque Maranhão, Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão (IHGM, o verdadeiro herói de Guaxenduba

Belém, a capital do Pará, por exemplo, fundada em 12 de janeiro de 1616, portanto dois anos depois da Batalha de Guaxenduba, segundo o professor e historiador Joâo Renôr Ferreira de Carvalho, membro fundador da Academia Imperatrizense de Letras, e já falecido, foi uma estratégia dos portugueses para consolidar, efetivamente, a presença lusitana nos dois primeiros núcleos iniciais da COSTA NORTE, ou seja, São Luís (MA) e Belém (PA).

De posse dessa informação histórica, não é errado dizer que Belém “é filha da Batalha de Guaxenduba”, pois foi a partir dela que a coroa portuguesa abriu os olhos e se precipitou a evitar que não só os franceses, mas também os ingleses e holandeses, se apoderassem no todo, ou em parte, das terras do hoje norte/nordeste do Brasil, no século XVII.

 A leitura atenta do livro a Ação e Presença dos Portugueses na Costa Norte do Brasil no século XVII, (Edufpi e Ethos Editora) publicado em 2014, obra do já mencionado historiador, revela isso a partir da citação de diversos documentos e fontes históricas.

O historiador/pesquisador, considerado um dos maiores do Maranhão, morreu em 20 de março de 2016, mas deixou apontamentos importantes sobre a história do Brasil com a perspectiva do olhar amazônico. 

Uma das últimas obras do professor Renôr foi essa já citada em que ele revela nuances dos dias, horas e minutos e as circunstâncias que marcaram Guaxenduba, muitas delas não estudadas nas escolas.

Nesta batalha campal de 19 de novembro de 1614 pela manhã a grande perda de vidas foi do lado francês. Morreu em luta Monsieur de Pisieux e mais cento e quinze combatentes. O sargento-Mor português cronista da guerra (Diogo Campos) afirma que a luta renhida durou pouco mais de uma hora (CARVALHO, João Renôr Ferreira. Imperatriz: Édupi, Ethos editora, 2014, p. 83)

Por uma dessas felizes coincidências, nesse novembro que acabou, mês em que a célebre batalha completou 408 anos, passaram por minhas mãos, além do livro do professor Renôr, duas outras obras que também citam a esquecida Guaxenduba.

Souza Lima (Manoel de Souza Lima), que é nome de escola e de rua em Imperatriz, patrono da Cadeira Número 01 da Academia Imperatrizense de Letras, considerado o primeiro morador de Imperatriz a publicar um livro, é autor de O Tupinambá, romance indigenista publicado em 1934.

Embora sendo um romance, o escritor faz referência a Guaxenduba ao misturar personagens reais com fictícios. O índio tupinambá Tempui, depois chamado de Itapecu, e que quando batizado adotou o nome de Luís Maria, personagem central da ficção, por exemplo, morre nessa batalha, deixando viúva a doce Amujaci, filha da grande “Nação Guajajara”.  Antes de partir com o amado para a Grande Ilha, Amujaci era aldeada, conforme o romance, às margens do rio Grajaú.

O Tupinambá é uma obra Indigenista flagrantemente inspirada em José de Alencar e outros ilustres brasileiros que escreveram sobre o tema. Se publicado em tempos atuais, na avaliação do poeta e escritor Ribamar Silva, membro da AIL, o autor seria laureado nacionalmente.

A obra é importante por natureza e ganha ainda maior importância por causa do seu caráter histórico, a começar pela descrição fiel da geografia da Ilha de São Luís e da região de Grajaú, notadamente as margens do rio Grajaú, naquela época, ambientalmente muito diferente do que é hoje. Souza Lima, certamente, para registrar e construir a narrativa em torno dos seus personagens, deve ter vivenciado aquela, ou aquelas, até então belíssimas e quase intocadas paisagens.

O original da obra foi resgatado na Biblioteca Benedito Leite, em São Luís, pelo professor Fernando Fernandes. Empolgado com o achado, e com o apoio de empresários de Imperatriz, a republicou em 2014 pela Ética Editora. O livro chegou às minhas mãos através do confrade Domingo César com a recomendação de que fosse devolvido, já que é “filho único” do acervo da academia Imperatriz de letras.

A terceira obra que mencionei sobre Guaxenduba e sua importância para o país, é Pelos Caminhos da História, nos bastidores do Brasil Colônia, Império e República, lançado pela Editora Civilização Brasileira, em 2015, e de autoria do diplomata e historiador brasileiro Vasco Mariz que morreu em 2017, aos 96 anos. Vasco era um apaixonado pelos fatos históricos e serviu em vária embaixadas brasileiras na  Europa. Com natural curiosidade histórica, tinha o costume de pesquisar “fios soltos” da história do Brasil nascendo daí diversas conferências no Brasil e no exterior.

 Em Pelo Caminhos da História, o autor, com riqueza de detalhes explora não só a Batalha de Guaxenduba, mas outros episódios da história brasileira também esquecidos. No livro, ele chega a lançar dúvidas sobre a paternidade francesa da fundação de São Luís.  Merece um texto em separado, que vou deixar para outra oportunidade.

 

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2023

Sálvio Dino e a passagem da “coluna prestes” pelo alto sertão maranhense

 

                              A Coluna Prestes esteve no Maranhão

ElsonMAraújo

 

    O advogado, político, jornalista, historiador, membro da Academia Maranhense de Letras, fundador da Cadeira Número dois da Academia Imperatrizense de Letras (AIL) Sálvio Dino, desde a adolescência desenvolveu um acentuado senso crítico diante das verdades prontas da história que a ele chegavam pelos bancos da escola. Principalmente aquelas havidas, ou encerradas no alto sertão maranhense, como também é conhecida a região sul do Maranhão, onde nasceu.

    Sálvio Dino, que nos deixou no período agudo da pandemia do coronavírus, levou essa inquietação para a vida adulta, e paralela às suas atividades jurídicas e políticas, com um acurado faro jornalístico e de historiador, foi coletando informações e lançando luzes sobre eventos importantes que tiveram o alto sertão maranhense como palco.


    O advogado Sálvio Dino, escreveu sobre a Coluna Prestes no Maranhão

    Para não me estender, na coluna de hoje trago a lembrança de dois fatos que conduziram o atilado acadêmico a produzir dois importantes registros para a história da banda sul do Maranhão. Em Parsondas de Carvalho, um novo olhar sobre o sertão, livro publicado em 2007, Sálvio Dino, resgata “a guerra do Leda”, disputa política sangrenta que na virada do século XIX para o XX, sob a batuta do então senador Benedito Leite, regou com o sangue de dezenas de inocentes, o chão do Alto Sertão do Maranhão. O ou outro registro, é sobre os aspectos da passagem da “coluna revolucionária prestes” pela região.

    A guerra do Leda vai ficar para uma outra oportunidade. Vou me ater levemente hoje ao segundo evento, prestes a completar cem anos, e que rendeu em 2016, portanto uma das últimas obras do autor, o livro A Coluna Revolucionária Prestes a Exilar-se (Passagem pelo sul do Maranhão). O livro é prefaciado pelo tembém membro da Academia Imperatrizense de Letras Agostinho Noleto.

    A Coluna Prestes foi um movimento revoltoso organizado por tenentistas (militares) que percorreu o interior do Brasil, entre 1925 e 1927, combatendo as tropas e denunciando o que o grupo considerava desmandos do governo de Artur Bernardes e Washington Luís. 


           Luis Carlos Prestes, o Cavaleiro da Esperança

    Durante a chamada Primeira República, os revoltosos percorreram mais de 25 mil quilômetros protestando e tentando levantar o povo contra o poder central. Os tenentes, liderados por Luís Carlos Prestes, passaram por esta região.  Na sua obra, Sálvio Dino resgata aspectos da passagem tenentista por aqui.

    Ao fazer memória da sua meninice, lá pra bandas de Grajaú, onde o pai Nicolau Dino, era juiz de Direito, Salvio Dino, no seu dizer poético registra:

     “vivia eu, menino de calças curtas, ouvindo histórias cabeludas sobre a passagem dos chamados revoltosos pelo nosso chão e por outras cidades sertanejas. Minha insatisfeita curiosidade pré-juvenil, levava-me a perguntar á mestra Caetana Costa, bem ali, na ladeira de barro, da cidade alta: professora, é verdade que os homens da Coluna, além de roubar cavalos, gados das fazendas, comiam criancinhas, quando tinham fome e nada encontravam para comer? (DINO, Sálvio, 2016,  p.25)

    Em a Coluna Revolucionária Prestes a Exilar-se Dino vai fundo nas fontes. Revisita diversos autores maranhenses, ou não, que já escreveram sobre o tema, e ainda esteve em algumas das cidades, como Grajaú, Balsas, Riachão e Carolina; cidade onde os revoltosos foram carinhosamente recebidos, abrigados e alimentados pelas lideranças simpáticas ao movimento. Além disso, pesquisou diversos documentos produzidos por testemunhas daquele fragmento histórico.

    Naquele tempo, se a revolta dos tenentes não era considerada uma ameaça, pelo menos já incomodava muito o governo.

    Com base na pesquisa do autor é possível perceber que naquela época uma das estratégias do poder dominante já era espalhar notícias falsas para desestabilizar qualquer movimento de cunho político contrário ao governo.

    Daí, não se estranhar a pergunta do então infante Sávio Dino a sua professora “se era verdade que os homens da coluna comiam criancinhas”.

    Não, não comiam criancinhas! Os tenentes da Coluna Prestes, mesmo que episodicamente nos 25 mil quilômetros de marcha tenham cometido alguns excessos, tinham um ideal.

     Sobre os ideais da revolta, Salvio Dino resgata um discurso proferido no dia 19 de novembro de 1925, em Carolina por um dos líderes da coluna, o então coronel Juarez Távora, bem como cópia de um manifesto ao povo maranhense publicado em o Libertador, órgão de comunicação da revolução, naquela ocasião impresso nas oficinas de O Tocantins, jornal semanário carolinense famoso, à época.

    O manifesto publicado em Carolina, e resgatado por Salvio Dino, foi assinado pelo general Miguel Costa e pelos coronéis Luiz Carlos Prestes e Juarez Távora, os líderes da coluna. 

    Veja logo abaixo um trecho do longo documento.

    A democracia foi substituída por um conluio reduzido de autocratas- duvidosa elite, surgida de uma seleção rigorosamente negativa. O voto é uma farsa e a soberania das urnas é uma conversão facultativa e vaga á que se sobrepõe, sempre, as conveniências e caprichos dos senhores absolutos

    A Justiça nem é cega, nem enxerga bem: possui, para a infelicidade do povo, a visão obliterada dos que olham, ao mesmo tempo para o montão de ouro com que se compram os venais para a espada de Dâmocles que ameaça a cabeça dos independentes.

    A administração é um descalabro. Os impostos escorchantes são uma indústria, mas vergonhosa com que se se esgota a economia do povo para enriquecer os políticos sem escrúpulos (DINO, Sálvio, 2016, p.130)

 

    Como é sabido, o movimento fracassou. No final de 1926, com mais de um ano de marcha, as lideranças passaram a discutir seu fim. O governo de Artur Bernardes estava prestes a ser encerrar, e, além do mais, a Coluna havia falhado em criar um projeto político de tomada de poder. A romântica empreitada não conseguiu mobilizar a população como esperado. Resultado?

    Em fevereiro de 1927, os membros da Coluna Prestes depuseram as armas e buscaram exílio na Bolívia.

    O Espaço é pequeno para uma viagem maior nos apontamentos de Sálvio Dino nesta sua importante obra sobre a passagem da coluna prestes pelo Alto Sertão Maranhense.  Um episódio com vários desdobramentos políticos para a história do Brasil e a vida de seus protagonistas, como bem deixa dito o escritor.

    Depois da aventura da Coluna Prestes, a história mostra que seus principais líderes permaneceram nas lides políticas, mas em campos ideológicos diferentes.

    Luís Carlos Prestes saiu da Coluna com o apelido de “Cavaleiro da Esperança” e tornou-se um dos grandes nomes da luta popular brasileira ao longo do século XX.  A marcha pelo interior do Brasil ao se deparar com o imenso fosso das desigualdades, segundos os historiadores, o levou a se “converter ao marxismo” em 1930, e   assumir-se comunista. Na mesma década, esteve envolvido com uma tentativa de tomada do poder no Brasil e diversas outras lutas. Foi perseguido e preso pelo regime de Vargas. É considerado uma das personalidades políticas mais influentes do País durante o século XX. Morreu, no Rio de Janeiro, em 7 de março de 1990.

    O outro líder do movimento, o eloquente Juarez Távora seguiu por outro caminho. Pela sua participação na Coluna Prestes chegou a ser preso, mas acabou sendo libertado, já no governo de Washington Luís.  Na sequência da militância política ,  nas eleições de 1930, foi eleito deputado federal no Ceará, porém não chegou a assumir o mandato em razão da Revolução de 1930  que que dissolveu o Parlamento. Passou um tempo no exílio na Argentina, mas depois voltou.  Na Era Vargas, ocupou os ministérios da Agricultura e dos Transportes e depois voltou para o Exercito. Foi ainda candidato a presidente da República tendo perdido a eleição para o  mineiro Juscelino Kubitschek.

    Morreu, assim como  Prestes, no Rio de Janeiro em Julho de 1975

 

 

 

Valor, sem valor


ElsonMAraujo

     O ser humano tem um grave defeito, que já nasce com ele: só valoriza o que tem, ou que lhe cerca, quando perde ou, num lampejo, percebe que pode perder a coisa. É quando começa a correr atrás. Uma corrida que pode ir do nada, para lugar nenhum, porque pode ser muito tarde. É quando o bom que foi perdido, não pode mais ser resgatado. Todos nós, a maior ou a menor, carregamos esse gene.  O bom, é que é algo que pode ser corrigido, ou pelo menos amenizado.

     Como tudo na vida, quando a gente desperta para a importância da consciência de se prestar atenção para os elementos que nos circundam, esse defeito pode ser afastado, ou como disse logo acima, amenizado.

     Quando comecei a raciocinar sobre esse tema lembrei de uma frase, até já muito batida e de autoria desconhecida, que diz que:  às as vezes é preciso cem anos para a gente enxergar algo que vemos todos os dias.  Acredito que o ditado é autoexplicativo.

     Quantas vezes não tivemos ali, bem do ladinho, uma “mina de ouro”, um “jardim do édem”, um “manjar dos deuses”, uma oportunidade incrível, a companheira, ou o companheiro dos sonhos, um aliado valoroso, e por não lhes dispensar a devida atenção e o valor necessários, deixamos correr tudo para longe, tal água corrente? Tem gente que nessa caminhada, deixa de valorizar até mesmo a liberdade.

     É comum nas rodadas de conversa, quando se toca nesse tema, só vir à tona questões relacionadas ao fim de um relacionamento. Mas esse defeito, o de não valorizar o que se tem ali ao alcance das mãos, dos olhos e da alma, além de ser possível de verificação, também permeia outros ramos da convivência dos homens com o outros, e consigo.

 Aqui , uma pequena pausa para outra  provocação: quantos talentos ao longo da vida deixamos de valorizar, quando era para valorizar, ou mesmo nem sabíamos que os tínhamos? E quantas pessoas talentosas que você conhece, e já conheceu, e que hoje reconhece que não se deu, ou não teve o reconhecido valor?

     Fico aqui, às vezes absorto, a imaginar como ficaria o mundo se o homem efetivamente despertasse para a tomada da consciência e valorização das fantásticas possibilidades físicas e espirituais de que é capaz e que estão Ali, enclausuradas, quietinhas, prontas para ganhar o mundo.

     O ser humano, com todos os seus defeitos, se constitui “numa perfeição”. Um verdadeiro designer inteligente, mas que precisa de um despertar de consciência para se autovalorizar e valorizar o que lhe cerca, a começar por prestar mais atenção ao semelhante. Afinal, não nascemos para a mediocridade.  Evoluímos genética e espiritualmente para feitos inimagináveis até hoje não adequadamente explorados nesses 200 mil anos do nosso surgimento na Terra.

     De tudo, uma quase certeza, o despertar dessa consciência não fará do homem algo pior do que já é.

 

 

 


Souza Lima, o primeiro escritor de Imperatriz

                                              Cidade de Imperatriz, 


ElsonMAraújo

 

    Souza Lima é nome de rua em Imperatriz. A rua não é grande. Começa na beirada da Floriano Peixoto, na Nova Imperatriz, e desemboca na Leôncio Pires Dourado, que por sua vez, acaba no “beiço” da BR-010.  Num rápido voo mental panorâmico percebe-se que a rua não é tão grande, como é a Ceará, mas a extensão é suficiente para imortalizar o nome desse importante vulto da literatura maranhense, agora sem nenhuma dúvida histórica, nascido em Imperatriz em 1889, mais precisamente no dia 15 de agosto. Ele também aformoseia com seu nome, uma escola municipal, na Vilinha.

    Quando se fala em ausência de dúvida quanto ao local de nascimento de Manoel de Souza Lima, é porque havia uma saudável discussão entre acadêmicos quanto ao local do nascimento do escritor. Para uns, como o poeta Ribamar Silva, ele apenas morou na cidade, mas sua terra natal era Grajaú. Para outros, como o romancista Agostinho Noleto, o autor é um legítimo filho de Imperatriz.

    Desse debate, aparentemente simples, surgiu no seio da Academia Imperatrizense de Letras um verdadeiro “especialista em Souza Lima”, o próprio Ribamar Silva, que tomou como missão literária conhecer (pesquisar)  toda a obra deixada  pelo patrono da cadeira 01 da Academia Imperatrizense de Letras (AIL),  hoje ocupada pelo jornalista Juscelino Pereira, mas sempre acreditando ter nascido o escritor em Grajaú.

    Dessa vez, a curiosidade não matou o gato, mas fez vir a lume o fim da dúvida. No final do ano passado Sérgio Saboia Lima, neto de Souza Lima, sabedor da existência dessa dúvida, fez chegar às mãos do poeta Ribamar Silva um rascunho esferográfico do próprio Souza Lima onde ele faz alguns apontamentos quanto à data, e o local do seu nascimento, ocorrido realmente em Imperatriz (MA), a data do seu casamento, em Boa Vista do Tocantins, Estado de Goiás, em 26 de maio de 1917, e os nomes de todos seus filhos. Boa Vista é a hoje cidade de Tocantinópolis (TO)

    Com o rascunho, recebido com efusividade pelo acadêmico pesquisador, findou-se a celeuma acadêmica, mas não o interesse dele pelo patrono da Cadeira 01 da AIL. Tanto, que na próxima quinta-feira na reabertura dos trabalhos da Academia Imperatrizense de Letras, Ribamar Silva fará uma palestra/apresentação sobre a vida e obra de Manoel de Souza Lima, o primeiro filho de Imperatriz a tonar-se escritor e a escrever um livro.

    Manoel de Souza Lima, ainda muito moço, trocou Imperatriz por Boa Vista. Também estudou em São Luís. Fez curso de prático em farmácia na capital, mas fez mesmo carreira foi de professor, não deixando de lado, entretanto, seu lado de escritor.

    Mesmo não tendo alcançado a fama dos grandes escritores nacionais, Souza Lima deixou um vasto acervo literário com obras que, se fossem avaliadas por especialistas em literatura brasileira,  seriam colocadas no  panteão das grandes  obras nacionais. Não seria nenhum abuso chamá-lo de “O José de Alencar do Maranhão”. Quem leu Iracema, do autor cearense, e depois mergulhar na leitura de O Tupinambá, publicado na década de 1930  pelo maranhense, é fatalmente conduzido a fazer a essa comparação,.

    No início desta semana, ao conversar com o confrade Ribamar Silva, ele, todo orgulhoso me disse que O Tupinambá é apenas uma das muitas obras deixadas por Souza Lima, que inclusive como o apoio da Academia Imperatrizense de Letras  e possíveis patrocinadores, pretende reeditá-las para que as novas gerações de escritores conheçam aquele que foi um dos grandes nomes da literatura maranhense da sua  época,  com o orgulho de ter nascido em Imperatriz.

    “Meu confrade, leia Sete Lagoas e depois a gente volta a conversar”. Sete Lagoas - Igapó Se Ié, na avaliação de Ribamar Silva, é outra obra-prima do imperatrizense Manoel de Souza Lima.

 

 

 

 


terça-feira, 14 de fevereiro de 2023

A crença que habita em nós

 

ElsonMAraujo

A crença e a busca pela sintonia com o eterno, são necessidades intrínsecas não só no ser cristão, mas também daqueles que professam uma fé, seja no que for. O que faz com que nos comportemos   como humanos de verdade, não é a nossa morfologia, mas o conjunto das nossas crenças, e a certeza de que não viemos do nada.

Sem a crença no eterno, nos resumimos a um simples ser vivo travestido de humano. Uma vez na condição de humanos eis um grande desafio: harmonizar-nos, no sentido amplo, com o ambiente em que vivemos e, assim, melhorar a relação com o outro no exercício do conviver social.

A fé concebida pelo nosso conjunto de crenças, se constitui num componente importante para o processo de  harmonização da sociedade. Se, sem fé é impossível agradar a Deus, ainda sem ela é impossível a construção de uma sociedade melhor. Uma sociedade justa. Nesse aspecto, podemos afirmar que a  fé é um elemento indutor do mover humano, tanto no aspecto positivo, quanto no  negativo. 

Hitler em nome da “crença” numa raça pura, exterminou milhões de Judeus. Milhões de negros foram escravizados sob o manto da “crença de que não eram gente, eram coisas; e hoje o estado islâmico, diante de uma fé cega e numa interpretação deturpada do Corão, comete todo tido de atrocidades. Na contraposição, Jesus Cristo, Gandhi, e Martin Luther king são  alguns exemplos de disseminadores da fé que “move montanhas”,  que cura as feridas mais profundas,  ressuscita mortos e que transforma a sociedade. Seus ideais permanecem, se eternizaram.

A fé, a boa, pode ser aprendida, desenvolvida e seus resultados apreendidos pelo tecido social. O que seria das sociedades sem esse tipo de fé?  Resumir-nos-íamos a meros zumbis vagando sobre a terra, sem rumo, indiferentes ao ambiente e às outras pessoas. O acreditar, assim como o duvidar,  faz parte da natureza humana;  e isso precisa ser cultivado!  E nesse pensar, torna-se importante a crença no aspecto de que o homem pode evoluir para algo melhor.

É crível que o Planeta possa ser ocupado por homens de muita fé e capazes de   coisas prodigiosas; entre elas {a principal},   a de construir uma sociedade, justa fraterna e igualitária. A crença nesses ideais não pode, jamais, ser perdida de vista, sob pena da sociedade se inclinar na direção de um processo contínuo de involução, o que nos levaria a uma condição de barbárie. 

Portanto, existe a fé que destrói e a fé que constrói.  E, é essa boa fé, a que constrói, que precisa ser disseminada em todos os quadrantes da Terra por nós, que ainda acreditamos que tudo é possível àquele que crer.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2023

Riqueza literária do Maranhão: A importância das academias de letras


 

ElsonMAraujo


Tenho dito que uma importante tarefa, ou responsabilidade das academias de letras espalhadas pelo país, é a de, naturalmente, resgatar e manter viva a história e os feitos literários de inúmeras personalidades que, se não a principal atividade, tinham a literatura como ofício, e que deixaram para a posteridade seus romances, poesias, contos, ensaios, novelas, músicas, etc.  Uns com fama nacional e internacional, outros nem tanto, mas que a exemplo dos famosos, também deixaram seus registros literários.

 O Maranhão é rico da presença de vultos literários que, cobertos pelo manto do tempo, caíram no esquecimento, que para mim é uma espécie de “segunda morte”; mas que graça às academias de letras, foram restaurados e hoje são estudados, declamados, e a atual geração pode, enfim, conhecê-los. Foram imortalizados!  Um exemplo clássico é Maria Firmina dos Reis. Maranhense da cidade de Guimarães, é considerada a primeira romancista negra do Brasil.

 Aqui perto, na cidade de João Lisboa, Firmina dos Reis dar nome a uma das cadeiras do conjunto de patronos da academia de letras, de lá. Cadeira ocupada pela socióloga, professora, escritora, pesquisadora Maria Natividade da Silva Rodrigues, hoje uma das maiores pesquisadoras da obra da maranhense, no Brasil.



 Quando uma academia de letras é fundada, cada uma das cadeiras recebe o nome de um patrono, que é escolhido, na maioria das vezes, pelo acadêmico ou acadêmica, antes da fundação. O critério, é a afeição pela vida e obra daquela personalidade que de alguma forma tenha marcado o mundo das letras e cultura brasileiras.   A Academia Imperatrizense de Letras (AIL), atualmente presidida pelo poeta Raimundo Trajano Neto, segue esse padrão. São 40 cadeiras, cada uma coroada com o nome de algum expoente da nossa literatura. Assim, não há como o ocupante do assento não mergulhar nas nuances da vida e obra daquele homenageado literato, que passaria eternamente para a “segunda morte”, se não fosse por aquela iniciativa.

 Às vezes ocorre de um acadêmico despertar para a obra do patrono de uma outra cadeira. Isso aí, aconteceu com o poeta Ribamar Silva. Ele ocupa a Cadeira 20, fundada pelo saudoso jornalista e historiador Adalberto Franklim e que tem como patrono o escritor maranhense, nascido em São Luís, João Dunshee de Abranches Moura. O são-luisense foi membro destacado da Academia Maranhense de Letras, e segundo o jornalista, escritor, pesquisador, e acadêmico, Edmilson Sanches, um dos maiores intelectuais já nascidos no Maranhão. Com tudo isso, a queda literária de Ribamar Silva é pelo escritor Manoel de Souza Lima.  Há anos ele pesquisa e escreve sobre a vida dele, patrono da Cadeira 01 da AIL, ocupada hoje pelo jornalista e advogado Juscelino Pereira.


 Além de resgatar toda bibliografia do autor, Ribamar Silva conseguiu acabar com uma dúvida acadêmica sobre o local de nascimento de Souza Lima, corrido em Imperatriz no final do século XIX.  Sendo, portanto, ele, o primeiro filho da cidade a se tornar escritor. As pesquisas apontaram até para a descoberta de um neto famoso do escritor imperatrizense, o festejado ator de TV e teatro, e também diretor de núcleo da Rede Globo, Wolf Maia.

 Em 2020 fui eleito membro da Academia Imperatrizense de Letras, na vacância da Cadeira 02, então ocupada pelo sertanejo advogado, jornalista, político e historiador Sálvio Dino, levado para eternidade pela pandemia do coronavirus. Dino era membro fundador do sodalício imperatrizense  e escolheu como patrono do assento, João Parsondas de Carvalho, nome de ruas e escolas, em  diversas cidades do Maranhão, e até do Estado do Pará.

Sálvio Dino alimentava uma intensa e produtiva atividade literária, e como não poderia deixar de ser, pesquisou, com o olhar de águia, a vida e obra de Parsondas de Carvalho, de cujos feitos ouvia falar desde que se entendeu por gente, lá pelas bandas de Grajaú, onde viveu na tenra juventude.

Da curiosidade e intelectualidade de Sálvio Dino, surgiram vários textos, palestras e debates sobre a trajetória do escritor, jornalista, geografo e mais um “montão de coisas, Parsondas de Carvalho, que morou em Imperatriz, ali na XV de Novembro. 

 Parsondas morreu na vizinha Montes Altos, em 1926, e ali também foi sepultado. Ele deixou um gigantesco legado em várias áreas do saber. Legado esse, alvo das pesquisas do saudoso Sálvio Dino.

Reputo o livro Parsondas de Carvalho, um novo olhar sobre o sertão, como o principal documento produzido pelo fundador da Cadeira 02 da AIL, sobre o patrono. Na obra, uma espécie de livro reportagem, Salvio faz uma releitura de Guerra do Leda, um livro/denúncia onde o autor relata, como contemporâneo dos acontecimentos, uma das maiores “carnificinas” já registradas no alto sertão maranhense sob o patrocínio do Governo do Maranhão.  Na época, o governador era João Gualberto Torreão da Costa, mas quem dava mesmo as cartas, ou seja, mandava, era o então poderoso chefe político e senador Benedito Pereira Leite, que mais tarde, entre primeiro de Março de 1906 e 25 de maio de 1908, veio a ser de fato, e de direito governador do Maranhão.

 Em Guerra do Leda, como escreveu no prefácio de Parsondas de Carvalho, um um novo olhar sobre o sertão, o saudoso escritor e desembargador Milson Coutinho, Parsondas relata a miséria moral, política, policial e denuncia os assassinatos do Estado Policial de Benedito Leite, que tiveram como palco cidades como Grajaú, Carolina, Imperatriz, Riachão e Balsas.

 A Guerra do Leda, texto já quase pronto, é o tema da coluna da próxima semana.

 


QUANDO DEIXEI DE ACREDITAR EM PAPAI NOEL

    ElsonMAraújo Neste dezembro de 2023, mais precisamente no próximo dia 25, completarão-se 49 anos desde que deixei de acreditar em Papa...