quinta-feira, 13 de fevereiro de 2025

O Encantador de Serpentes



(Republicação)

ElsonMAraujo

Quando a ciência ainda não se impunha com a autoridade dos tempos modernos, problemas simples e, por vezes, complexos eram resolvidos pelo saber ancestral, transmitido de geração em geração. Sobretudo as questões de saúde, que, antes de médicos e fármacos, eram confiadas às mãos sábias das rezadeiras e benzedores. Essas figuras, dotadas de uma aura de mistério e respeito, eram a esperança das mães aflitas e dos pais resignados.

Minha saudosa mãe, Teresa, confiava nesses rituais. E por isso, algumas vezes, me levou a um desses mestres da cura. Lembro-me, em especial, de uma tarde em que fui conduzido a um rezador para "cortar uma íngua" – um caroço dolorido na virilha, seguido de febre. A casa do benzedor era humilde, feita de taipa e coberta com palha de babaçu. No terreiro bem varrido, galinhas ciscavam entre porquinhos que remexiam a terra, enquanto um cajueiro carregado espalhava pelo ar um aroma adocicado. As pipiras, numa algazarra, se fartavam dos frutos maduros. São memórias que, mesmo com o passar dos anos, permanecem intactas.

Minha mãe explicou ao velho benzedor o motivo da visita. Com gestos tranquilos, ele me pediu que retirasse a alpercata e firmasse o pé no chão. Pegou uma faca de cabo de chifre de boi, riscou a terra ao redor do meu pé e, enquanto murmurava palavras indecifráveis, desenhou pequenas cruzes no chão. Feito isso, despediu-se com um aceno e um olhar de quem já sabia o desfecho. E não demorou: dias depois, eu já corria pelos quintais da vizinhança, como se nada tivesse acontecido.

Nesses tempos de escassez de médicos e remédios, a fé era o único refúgio. Rezas, chás, banhos e unguentos formavam o arsenal terapêutico da sabedoria popular. Ainda hoje, há quem preserve essas práticas. Minha cunhada Socorro Oliveira, por exemplo, dedicou-se a estudar essas tradições e, inclusive, apresentou um trabalho acadêmico sobre o tema em uma instituição portuguesa. Ciência e tradição, muitas vezes, caminham juntas.

E o encantador de serpentes, do título? Ah, não me esqueci dele! Eles ainda existem. Fragmentos dessa antiga arte podem ser encontrados em algumas regiões do Maranhão. Conheci um deles no início da pandemia, em São Raimundo das Mangabeiras. A descoberta veio por meio de um sobrinho por afinidade, Diego, o nome dele, que lamentava a perda de uma vaca de leite e três cabras, vítimas das cobras peçonhentas que infestavam a fazenda.

– Vou procurar o encantador – disse ele, com a certeza de quem já testemunhara a eficácia do método.

Na casa do homem, um entra e sai constante. Quando chegamos, ele estava "alinhando a arca" de um vizinho. Com uma camisa velha, media as costas do paciente e explicava, com convicção:

– Tá vendo aqui? Tem uma diferença grande. Vamos ajeitar isso agora!

A "arca caída", também conhecida como espinhela caída ou peito aberto, é uma aflição popularmente diagnosticada por fortes dores na boca do estômago, nas costas e pernas, acompanhadas de cansaço. Para aquele benzedor, a cura vinha da reza – e sem margem para dúvidas.

Mas e as serpentes? Como ele pretendia livrar a fazenda do meu sobrinho delas? Por R$ 300,00, prometeu resolver o problema, mas, dessa vez, sem precisar ir até o local.

– Tenho uma viagem marcada – justificou. – Mas não se preocupe, faço o serviço daqui mesmo!

Naquele primeiro semestre de 2020, tudo era remoto. Até os encantamentos.

Antes de nos despedirmos, contou-me que herdara o ofício do avô e já preparava o filho para seguir seus passos. Gabava-se de que ninguém jamais contestara a eficácia do seu trabalho.

Cinco meses depois, já de volta a Imperatriz, lembrei-me do caso e resolvi perguntar ao sobrinho sobre os resultados.

– Sumiram! – respondeu ele, sem hesitação. – Nunca mais perdi uma vaca.

E assim, São Raimundo das Mangabeiras ganhou seu primeiro encantador de serpentes remoto. Entre a fé e o ceticismo, o importante é que as cobras, de fato, nunca mais voltaram.

 

sábado, 1 de fevereiro de 2025

Pequenos diamantes da alma

 


ElsonMAraújo 

 

 O corpo é a roupa da Consciência.  

A Consciência é a roupa da alma. 

(ElsonMAraújo

 

Sempre gostei de frases. Chegou um tempo em que até as colecionava. Anotava tudo. Antes, naqueles cadernos de capa dura e costura de arame. Depois, no computador. A princípio, frases ou pensamentos bíblicos, fruto da minha formação cristã. Mais tarde, passei a prestar atenção nas frases soltas dos filósofos gregos até chegar aos contemporâneos.

 As frases, ditados, expressões populares, haicais, aforismos — não consigo divisar exceções — encerram grandes ensinamentos. São gotas valiosas de sabedoria expostas, verdadeiros diamantes das almas em momentos de transbordo. Também, parafraseando o poeta Ribamar Silva, da Academia Imperatrizense de Letras, numa de suas definições sobre o que é a poesia, são verdadeiras fraturas expostas da alma.  Mesmo fora do contexto, ensinam.  

 Percebo e ouso dizer que há algo de mágico na forma como um provérbio africano, um verso de Camões ou um haicai japonês podem resumir séculos de observação humana. São como mapas antigos, desenhados por navegadores de diferentes eras, que nos guiam por mares já conhecidos, mas sempre novos. Lembro-me de uma frase de Heráclito lida num livro didático na minha adolescência: Ninguém entra duas vezes no mesmo rio”. Naqueles idos, parecia apenas poesia ou uma simples frase solta.  Hoje, entendo que é um tratado sobre o fluxo da existência, escondido em doze palavras.  

 Os grandes mestres sabem que a brevidade é irmã da profundidade. Um aforismo não se explica; instala-se. Certa vez, li em Lao Tsé: Quem sabe não fala, quem fala não sabe. Fiquei horas ruminando aquilo, como quem mastiga uma semente desconhecida, até extrair seu sabor amargo e doce. Percebi que as frases mais luminosas exigem um pacto: só revelam segredos a quem as contempla em silêncio.  Ruminá-las é preciso!

 Algumas dessas pérolas verbais tornam-se parte de nós. Lembro-me de meu avô materno, Mestre Otávio, homem simples do interior do Maranhão, que repetia: Cão que late não morde, mas assusta o dono. Na época, ria da rusticidade. Anos depois, ao ver como o medo paralisa mais que a ação, compreendi que ele resumira, em uma linha, o poder das ilusões. São essas heranças anônimas, transmitidas de geração em geração, que tecem a trama invisível da sabedoria coletiva.  

 Minha coleção migrou dos cadernos rabiscados para arquivos na nuvem. Algumas se perderam no tempo, mas a essência permanece. Curioso notar como, na era dos algoritmos, ainda buscamos refúgio em fragmentos de eternidade. Um tweet,  um verso de música, um  Post filosófico — tudo pode carregar a centelha de um diamante. Recentemente, encontrei numa rede social: Viver é ajustar a alma à tempestade sem perder o brilho. Não sei o autor, mas reconheço ali o mesmo fôlego dos antigos.  Dizer o muito no pouco. Por aqui tempos grandes especialistas nessa matéria. Alguns, como o já citado Ribamar Silva, Zeca Tocantins e o professor José Geraldo, são membros da gloriosa Academia Imperatrizense de Letras.

 Há uma alquimia peculiar em condensar verdades complexas em poucas sílabas. Nietzsch ,( olha o poeta aqui de novo)  que me foi apresentado pelo confrade Ribamar Silva,  brincava com isso: Deus está morto ecoou como um trovão, mas quantos perceberam que era um lamento, não um triunfo? Já os haicais, o professor José Geraldo é um craque neles, com sua estrutura de 5-7-5 sílabas, ensinam que a limitação é o berço da criação. Talvez por isso, em um mundo saturado de discursos, as frases curtas sejam faróis — não iluminam tudo, mas mostram a direção.  

 No fim, percebo que uma frase, compreenda, aquelas bem nascidas, não são meras palavras, mas sementes de almas. Cada autor, conhecido ou anônimo, deixou um fragmento de seu fogo interno. Como dizia Guimarães Rosa,  olha seu autor preferido aqui, confreira Adriana Moulin-  o real não está na saída nem na chegada: ele se dispõe para a gente é no meio da travessia. Essas frases são justamente isso: clarões no meio da travessia, pequenos diamantes que, mesmo nas noites mais densas, lembram-nos que a alma humana é uma mina inesgotável de luz.  

 E assim sigo, caderno aberto, olhos atentos, catando no chão da existência as pedras preciosas que outros, em seus transbordos, deixaram cair. Vivos, sejam eles,  para todo sempre!

 

sexta-feira, 11 de outubro de 2024

É PRECISO SAIR DA ILHA

ElsonMAraujo

 

Alguns temas são recorrentes aqui neste espaço. Não tenho nenhum constrangimento com isso, porque alguns desses assuntos já alcançaram as bênçãos da atemporalidade e, pelo menos para mim, são sempre bem-vindos. É o caso da faculdade inerente ao ser humano de o tempo todo julgar tudo e todos, já explorado numa crônica que publiquei em março de 2016.

Todos nós somos julgadores, o problema é que os julgamentos estão cada vez mais superficiais e quase sem fundamento. Daí, por conta disso, o risco de a sociedade planetária entrar, num sentido amplo, num período de trevas. A tão combatida intolerância e seus desdobramentos, ao meu sentir, são as filhas malditas dessa superficialidade que tem custado caro aos povos da Terra.

Não é difícil perceber que a sociedade moderna hoje se reveste em milhares de impenetráveis microcosmos que não se comunicam, não interagem, e estão ficando, num processo contínuo, a cada dia mais distantes de qualquer contraditório, com cada um cimentando e defendendo suas verdades. O escritor e colunista Moisés Naím, especialista em economia e política internacionais, a grosso modo, denomina esses microcosmos e micropoderes. Já abordei esse tema também por duas vezes neste espaço. É a partir dessas bases que são feitas as escolhas, não só das coisas, mas também dos governos.

Escolher ou julgar um fato, uma coisa, um destino tendo por base um “único lado da moeda” é perigoso em todos os sentidos, até porque nada é absoluto. Defendo que é preciso olhar o todo, analisar todas as variáveis possíveis para um aprimoramento dos nossos julgamentos, ou para um melhor fechamento das nossas escolhas, seja a compra de um carro ou do próximo dirigente do município, do Estado ou do País. Como diria o Prêmio Nobel de Literatura de 1998, o português José Saramago: “É preciso sair da ilha para ver a ilha. Não nos vemos se não saímos de nós.” E aí eu completo: é preciso visitar outros “cosmos” para conhecer o universo por inteiro.

Julgar não deixa de ser uma escolha, já que você opta por essa ou aquela tese. O homem é assim, um animal julgador por essência. Julga não só pessoas, mas também fatos e coisas. “Nem a mãe natureza escapa”. São julgamentos, na maioria das vezes, sem direito ao contraditório e à ampla defesa, onde o indubio pro reo, máxima do direito que diz que na dúvida deve-se beneficiar o réu, anda a léguas de distância. As sentenças são sumárias, e quase todas condenatórias. Coitados de nós.

Vivemos tempos em que as opiniões voam como penas ao vento, espalhando julgamentos levianos. E o problema não é apenas julgar, mas a rapidez com que se forma um veredicto. Um deslize capturado por uma câmera de celular vira motivo de execração pública em minutos. Em questão de horas, uma vida pode ser arruinada sem que haja espaço para o outro lado da história. A superficialidade, alimentada pela necessidade urgente de opinar, não nos permite ver a profundidade de cada ser humano, de cada situação.

Ainda há tempo de refinar nossa arte de julgar. Talvez o grande segredo seja deixar de lado a ansiedade de emitir um parecer imediato e, antes de mais nada, escutar. Escutar o outro, o silêncio, as entrelinhas. Porque, afinal, antes de julgar o mundo, é preciso primeiro entender o que se passa dentro de nós mesmos.


sexta-feira, 13 de setembro de 2024

Quando as raízes são fortes, não importa o tamanho da poda: a vida volta a brotar

 

A árvore sentada

ElsonMAraujo 

 

Na BR-010, no trecho urbano de Imperatriz, entre o Riacho Cacau e a área do 50º BIS, ainda é possível encontrar algumas espécies da flora amazônica e do cerrado. Entre elas, destacam-se os ipês, mangueiras, cajueiros e faveiras. Algumas dessas árvores foram plantadas nas décadas de 1990 e 2000, mas, com um olhar mais atento, ainda se encontram exemplares remanescentes da década de 1960, quando o engenheiro Bernardo Sayão comandou a construção da rodovia que transformou, para sempre, a história de Imperatriz.

Transformei em hábito, sempre que percorro esse trecho da BR-010, tentar identificar as árvores mais antigas. Imagino-as e admiro-as como verdadeiros totens de nossa ancestralidade. Talvez não houvesse celulose suficiente para todos os acontecimentos guardados no DNA da bruta seiva que corre em cada uma delas.

Não é difícil identificar esses monumentos ao longo da rodovia. As mais resistentes ao tempo permanecem entre a Rodoviária Velha e o 50º BIS.

Nas idas e vindas pela BR, muitas vezes fui tentado a parar para fotografar, especialmente nos meses de julho, agosto e setembro, quando os ipês florescem neste canto do país, onde se entrelaçam os biomas Amazônia, Cerrado e Caatinga. Tenho muitos registros. Um dos mais preciosos é o de uma antiga faveira, que chamava atenção não só por sua imponência e a enorme copa que oferecia sua generosa sombra nos dias de sol ardente, mas também por uma característica singular: parecia estar sentada. Além disso, resistiu bravamente a inúmeras intempéries que quase a arrancaram daquele solo.

Uso o tempo passado para me referir à famosa árvore sentada da BR-010, imortalizada em uma tela do jornalista, escritor e artista plástico João Marcos, exposta no Centro Cultural Tatajuba, porque ela, de fato, virou memória. Recentemente, num dia de sol forte, passei pelo local apenas para revê-la, mas ela já não estava mais lá. Pensei, de início, que tivesse sido retirada pelas mãos humanas, mas logo descobri que, em um desses dias de fortes rajadas de vento, seu tronco já cansado não resistiu. De sentada, a árvore tombou. Ficaram apenas as raízes.


Não é figura de linguagem, nem licença poética. Digo que chorei, e não é metáfora. Foi uma tristeza sincera. Os dias passaram. E nesta semana, precisamente na quarta-feira, 11 de setembro, algo me chamou a atenção ao passar novamente pelo local: das raízes que permaneceram firmes, brotavam novos fios de um verde intenso, quase doloroso de tão vibrante. Um sinal claro de que a vida ali está se renovando. Uma bela lição: quando as raízes são fortes, não importa o tamanho da poda, a vida sempre volta a brotar.

Penso que essa árvore é uma metáfora viva da própria cidade de Imperatriz. Assim como ela, a cidade enfrentou ventos contrários ao longo de sua história. As tempestades das crises econômicas, as podas de períodos de descaso e até a força devastadora das chuvas fortes. Mas, como as raízes daquela faveira, as de Imperatriz também são profundas, fincadas no solo da resistência e da coragem de seu povo. E, como ela, a cidade insiste em renascer, mais forte, a cada golpe do destino.

Vejo também, na resiliência da árvore, um reflexo da vida de cada um de nós, que, muitas vezes, somos obrigados a enfrentar perdas, quedas e desilusões. São nesses momentos, quando a poda parece mais severa, que nossas raízes mais internas precisam se firmar e buscar o que de mais forte e verdadeiro temos dentro de nós. A natureza nos ensina que o renascimento não é apenas um ato de sobrevivência, mas de esperança.

Agora, cada vez que passo pela BR-010, olho para o ponto onde a velha faveira um dia se ergueu e sinto que ela ainda está ali, de alguma forma, presente. Suas novas folhas são promessas verdes que murmuram silenciosamente ao vento: sempre haverá um retorno, uma nova vida, uma outra oportunidade para florescer. Porque a vida, mesmo quando parece ter terminado, sempre encontra um jeito de se reinventar, de recomeçar — como se fosse uma semente, germinando outra vez, no terreno fértil de nossas histórias.

sábado, 10 de agosto de 2024

A VIDA EM TODO LUGAR


ElsonMAraujo


Não diria que é uma paixão, mas confesso que tenho um grande apreço pela fotografia. Durante aproximadamente cinco anos, vivi uma espécie de encantamento por essa arte, que floresceu a partir da minha admiração pelos trabalhos do renomado maranhense Brawnir Meireles, um dos melhores fotógrafos do Brasil. Também me inspirava nas obras do fotojornalista Daniel Sena, cuja maestria era inegável. Quando ocupava um cargo público, incentivei a Fundação Cultural de Imperatriz (FCI) a promover um concurso de fotografia. O evento contou com pelo menos sete edições e atraía muitos artistas da luz, movimentando a cena cultural da cidade por um longo período.

 O “Olharte Imperatriz”, sob a direção do inquieto Lucena Filho e sua equipe, tornou-se um marco na história local. Embora a intensidade do meu amor pela fotografia tenha diminuído, o apreço pela arte permanece.

Para aqueles que escrevem, a fotografia é um poderoso estímulo. Muitas vezes, a beleza – ou a falta dela – chega com uma força tão intensa que apenas capturar a imagem não é suficiente; é preciso também eternizar aquele momento em palavras. Já vivi essa experiência várias vezes e considero essa prática uma valiosa ginástica para fortalecer e estimular as conexões cerebrais.

Recentemente, deparei-me com uma cena que me impactou profundamente e que logo procurei registrar. Infelizmente, perdi o registro quando formatei meu computador. Tratava-se do nascimento de uma  flor vinca em um local dos mais improváveis: no vinco de uma parede que mais recebe a luz do sol em minha casa. A pequena planta, que sobreviveu por pelo menos cinco meses, brotou no concreto puro, sem qualquer adubo. Mesmo assim, todos os dias, saudava os moradores da casa com sua brancura (existem outras cores), impressionando-me com sua resistência e capacidade de sobrevivência.

O fato de a vinca ter surgido em um ambiente tão hostil pareceu-me uma metáfora para a vida. Em meio às adversidades e à falta de condições ideais, a vida ainda é capaz de encontrar um caminho. Essa experiência me ensinou que, mesmo em circunstâncias desfavoráveis, com um pouco de água, atenção e um ingrediente primordial chamado amor, a sobrevivência é não apenas possível, mas muitas vezes surpreendente.

Além disso, a vinca, cientificamente conhecida como *Catharanthus roseus* ou *Vinca rosea*, também chamada de planta boa-noite ou vinca de Madagascar, possui propriedades medicinais notáveis. Rica em alcaloides, esta planta é recomendada para auxiliar no tratamento de feridas, diabetes e pressão alta, devido às suas propriedades cicatrizantes, diuréticas e antidiabéticas.

A presença dessa planta em um local tão improvável não é apenas um testemunho de sua resiliência, mas também um lembrete de que, em muitos aspectos, a vida, assim como a vinca, encontra maneiras surpreendentes de prosperar.

Ao refletir sobre a perseverança desta pequena planta, percebo que cada um de nós, em nossas jornadas pessoais, pode encontrar inspiração e força nas circunstâncias mais inesperadas. Talvez, assim como a flor  vinca, possamos todos florescer e prosperar, mesmo quando o cenário à nossa volta parece menos que ideal.

 

 

 

 

 

 

 

domingo, 28 de julho de 2024

CREIO

 

Ao longo da vida, por diversas questões, pessoais e também circunstanciais, cheguei a duvidar da existência de Deus. Nasci e cresci num lar cristão/católico. Batismo, Primeira Comunhão, crisma, clube de jovens, movimentos carismáticos, enfim, fiz tudo que um jovem cristão, nascido num lar católico, por tradição familiar, no início da vida precisava fazer. Anos depois, frequentei a Assembleia de Deus. Imagine então o dilema que vivi quando das vezes em que duvidei da existência do Criador? Tudo ficou só comigo. Tema sensível, socializo pela primeira vez aqui neste cantinho semanal. Mas, e tudo tem sempre um mas, minha descrença durou pouco.

Costumo hoje dizer, em tom de brincadeira, que tentei algumas vezes ser ateu. O ateísmo é a ausência de crença em uma ou mais divindades, mas no senso comum se convencionou que é a pessoa que não acredita em Deus. Enfim, minha tentativa de virar um “sem Deus”, graças a Deus, foi frustrada. É que por mais que tentasse provar, para mim mesmo, a inexistência dele, a coisa não dava certo. Sabe o porquê? É que a cada tentativa, mais Ele aparecia na minha frente, estando presente em tudo que via. Vez por outra, lembrava daquela saudação, típica do islam.  ”O Deus que habita em mim, é o mesmo que habita em você”. Uma frase que hoje considero de uma profundidade extraordinária.

Em outra ponta, recordava dos tempos da catequese quando fui ensinado que Deus mora dentro de nós, e que nosso corpo é o templo do Espírito Santo, um dos componentes da Santíssima Trindade. Na época de infância, não tinha, mas que hoje faz muito sentido para mim.

Como uma coisa puxa outra, também vinha até mim o conceito bíblico que diz que Deus verdadeiramente é onisciente, onipresente e onipotente e que possui várias moradas, uma delas no nosso interior. Não tenho mais dúvida da existência de um Ser Superior, que tudo sabe, que tudo vê, que equilibra o universo quando há necessidade de equilibrá-lo e que, de igual modo, o desequilibra.

E foi numa dessas noites insones, em que a mente teima em rever o passado e imaginar o futuro, que me peguei refletindo sobre a simplicidade da fé. Lembrei-me das palavras de um santo católico, que dizia que é no silêncio do coração que Deus fala. Na minha mente inquieta, algo insistia em pontuar que não é preciso buscar sinais espetaculares ou milagres grandiosos para sentir a presença de Deus. A presença divina se manifestava nas pequenas coisas, nas sutilezas do cotidiano, no sorriso de uma criança, no pôr do sol, no abraço sincero de um amigo. Essas pequenas manifestações me fizeram perceber que Deus não está distante, mas sim intimamente ligado a cada momento de nossas vidas.

Gosto muito de ler textos sobre esse tema e da lavra de autores de diversas confissões, evidentemente construídos em momentos de profundas reflexões. Ouso até dizer que essas reflexões são provocadas pelo próprio Criador de todas as coisas. Dias desses cheguei a uma conclusão: Estou certo? Não sei! Contudo, essa conclusão não sai da minha cabeça: a de que nesse lado do Planeta Terra, nos “ensinaram” Deus de forma deturpada. O homem complicou demais a existência dele ao cercá-lo de verdades engarrafadas, utilizando-o, por meio das religiões, como instrumento de dominação. Outra conclusão: a relação com Deus é mais simples do que muitos imaginam, principalmente porque somos uma de suas moradas.

Deus existe sim! Está presente em todos os lugares, em todos os momentos, inspirando e se mostrando, o tempo todo, a todos os seres da Terra. Deus existe sim! E se faz revelar a todo momento. E, assim, na simplicidade da fé renovada, encontrei paz e um sentido profundo para a minha existência, percebendo que, em cada pequena coisa, Ele se revela e nos convida a viver com amor e gratidão.

sábado, 20 de julho de 2024

UM POUCO SOBRE A MULTIDÃO


Tem gente que tem medo de multidão ou sente crise de ansiedade incontrolável quando se depara com esse tipo de situação. Esses dois mecanismos têm até nome. Nomes esquisitos, por sinal. O medo explícito de multidão a ciência batizou de demofobia. Também conhecido por oclofobia ou enoclofobia, que é quando se tem fobia de estar em ambientes cheios de pessoas. Já a situação de ansiedade incontrolável a ciência denominou de agorafobia, que ocorre tanto em lugares fechados quanto em abertos. Ambas as denominações mencionadas, no geral, significam, numa linguagem bem nossa, o medo de estar no meio de muita gente.

O contrário também existe. Há muitas pessoas que conseguem, por vários motivos, se encontrar na multidão. A psicologia e sua prima, a sociologia moderna, estudam esses fenômenos da natureza humana. Enquanto a sociologia estuda o comportamento e a interação de indivíduos em um grupo, a atração por multidões e sua influência sobre estes, a psicologia social vai estudar a sensação de pertencimento, excitação sensorial e até uma tal de filifilia, denominação esquisita para descrever a não menos esquisita atração sexual por multidões ou aglomerações. Perceba aí a complexidade do ser humano, que não se reduz a uma montanha de células, músculos, suor e sangue, mas a um complexo mecanismo, uma pedra bruta objeto de observação e estudos permanentes.

Confesso que este não seria o tema da semana. Mas aí a gente começa a escrever, vai refletindo, o pensamento fluindo e o tema que seria para estar aqui hoje vai ficando lá para trás. Talvez nem volte mais.

Não me enquadro em nenhum quadro dos estudos referidos até aqui. Mas fiquei curioso para descobrir como se denomina as pessoas que gostam de observar multidão, como é meu caso. O hábito de escrever me levou ao hábito de observar com mais acuidade o “mundo ao redor”. E isso inclui coisas e pessoas. Já escrevi tempos atrás uma crônica sobre a experiência sensorial que foi de percorrer a pé um dos caminhos da cidade. Foi bacana porque acabei por enxergar coisas que via todos os dias. Não é que essa prática, para minha surpresa, também tem nome?

Novidade para mim: flâneurisme é o conceito filosófico e cultural que envolve caminhar pelas ruas da cidade de forma despretensiosa e atenta, observando os detalhes do ambiente urbano e das pessoas que o habitam. Justamente o que fiz e resultou na crônica "Do que Sentirei Saudade Quando Morrer?", que pode ser acessada no seguinte endereço: https://regiaotocantina.com.br/2024/05/19/do-que-sentirei-saudade-quando-morrer/ publicada em Maio 2024 e em maio deste ano.

Pois flâneurisme  foi a denominação mais próxima que encontrei para explicar o gosto que tenho de explorar meus sentidos ao percorrer a cidade e a me deparar com aglomerações de pessoas e, por vezes, multidões. Lembrei que fazia isso bem antes de intensificar o hábito de escrever, que vem da  infância.

Aprendemos muito com a observação dos tipos humanos reunidos, seja nos pequenos ou grandes espaços. Desde as heranças físicas/genéticas até a análise comportamental. E nem precisa ser cientista para isso.

As aglomerações, os ajuntamentos de gente constituem-se em verdadeiros laboratórios onde é possível aprender e apreender muito sobre as dimensões do ser humano. Cada rosto, cada gesto, cada murmúrio ou exclamação revela um fragmento do mosaico que compõe a nossa humanidade. É como se cada indivíduo fosse uma página viva de um livro interminável, onde histórias de vida, esperanças e desilusões se entrelaçam, formando uma tapeçaria rica e multifacetada.

Nas grandes cidades, como nossa querida Imperatriz, as multidões são como rios caudalosos, onde a correnteza de pessoas flui incessantemente. Observar essa correnteza é como mergulhar num universo paralelo, onde se pode testemunhar a diversidade da experiência humana. Ali, no meio da massa de corpos e vozes, percebemos que somos, ao mesmo tempo, únicos e parte de um todo maior. É nesse fluxo contínuo de vida que reside a beleza da multidão: uma celebração constante da existência humana, com todos os seus paradoxos e maravilhas.

O Encantador de Serpentes

(Republicação) ElsonMAraujo Quando a ciência ainda não se impunha com a autoridade dos tempos modernos, problemas simples e, por vezes...